Abaixo, ofício encaminhado hoje ao Secretário da Atenção Primária à Saúde do Ministério da Saúde, Dr. Felipe Proenço, e ao Secretário da Atenção Especializada à Saúde do Ministério da Saúde, Dr. Adriano Massuda
Excelentíssimo Senhor Secretário da Secretaria de Atenção Primária à Saúde do Ministério da Saúde do Brasil, Dr. Felipe Proenço,
Excelentíssimo Senhor Secretário da Secretaria de Atenção Especializada à Saúde do Ministério da Saúde do Brasil, Dr. Adriano Massuda,
Vimos respeitosamente a V.Exa. por meio deste ofício, também aberto à população em nosso site, em parcerias com principais entidades e organizações nacionais que representam o cuidado à pessoa com obesidade, especialmente aquelas que assinam abaixo, expressar nosso desejo e apoio para que o Brasil atue mais consistentemente na ordenação do cuidado do sobrepeso e obesidade em todo o território nacional de forma intersetorial, conforme orientações estabelecidas pelos Estados Membros em conjunto com a Organização Mundial da Saúde (OMS), e pautado pelos dados de prevalência e projeções financeiras da situação. Para tanto, acreditamos que, assim como no caso da Oncologia, seria importante a existência de uma coordenação específica para a Obesidade dentro do Ministério da Saúde.
Diante dos dados publicados no Atlas Mundial da Obesidade 2024, o Brasil teve, em 2019, 177.929 mortes atribuíveis ao alto índice de massa corporal (IMC), além de projeções de 50% das crianças brasileiras com IMC elevado, em 2035, e aproximadamente 140 milhões de adultos convivendo com o excesso de peso no país, nesse mesmo ano. Muitas dessas projeções são corroboradas por inquéritos nacionais de vigilância em saúde e dados dos sistemas de informação do Sistema Único de Saúde (SUS), que indicam, ano após ano, o aumento do sobrepeso e da obesidade no país, contrariando a meta estabelecida pelo Ministério da Saúde no Plano de DANT. Apenas em 2019, os gastos no SUS para o cuidado do excesso de peso foram de R$ 1,5 bilhão, representando 22% do gasto anual direto com condições crônicas não transmissíveis no país.
A alta prevalência de obesidade e seus fatores de risco, como inatividade física, alimentação não saudável e distúrbios do sono, associam-se diretamente à alta prevalência de outras sérias condições crônicas não transmissíveis (CCNTs/DCNTs), com destaque ao diabetes, câncer e doenças cardiovasculares. Ademais, conforme literatura, a obesidade se correlaciona com comorbidades como síndrome metabólica, incapacidade funcional, acometimentos osteoarticulares e, ainda, transtornos mentais, como a depressão. Tem-se observado, além de tudo isso, a associação entre obesidade e o agravamento e mortalidade por síndromes respiratórias, como a provocada pelo SARS-CoV-2.
Dessa forma, além do quadro da obesidade como doença, com comprometimentos funcionais e sociais para o indivíduo, há o agravamento do excesso de peso ser fator de risco para as principais condições crônicas não transmissíveis que mais levam a óbitos no território nacional. Portanto, para que o país busque alcançar a meta 3.4, do Objetivo de Desenvolvimento Sustentável 3 (ODS 3) da Agenda 2030 da Organização Mundial da Saúde (OMS), de reduzir em um terço as mortes prematuras por doenças crônicas não transmissíveis, é urgente ampliar esforços para o controle da obesidade.
Diante desse cenário, trazemos recomendações da OMS, lançadas em 2023, no documento Health service delivery framework for prevention and management of obesity. Este, conclama os países para uma resposta correspondente do sistema de saúde, a fim de garantir que os serviços para prevenir, tratar e gerir a doença estejam universalmente disponíveis, acessíveis, e sustentáveis. As recomendações presentes no documento integram respostas dos sistemas sociais e de saúde que podem ser adaptadas conforme o país, o contexto, as circunstâncias e as necessidades, evitando a necessidade de conceber e fornecer modelos novos e diferentes para a prestação de serviços e de trabalho da saúde.
Essas recomendações estão interligadas com intervenções adicionais propostas no pacote prioritário WHO Acceleration Plan to Stop Obesity. O Brasil é um dos 25 países selecionados como prioritários dentro deste pacote, como o compromisso de implementação das recomendações de prevenção e manejo da obesidade ao longo da vida.
O Plano Nacional de Saúde 2024-2027, formulado após a 17ª Conferência Nacional de Saúde e com o qual o FórumCCNTs e seus parceiros contribuiram com propostas acatadas que incluíram estratégias para prevenção e tratamento da obesidade, cita a obesidade e seus números alarmantes em vários momentos, principalmente em pontos sensíveis à Atenção Primária à Saúde (APS). Como objetivos e metas do plano escolhidos pelos representantes da sociedade civil está presente: “Ampliar a proporção de atendimentos individuais por problema ou condição avaliada ‘obesidade’ na Atenção Primária à Saúde de 3,5% para 5,0%.”, o que claramente demonstra a invisibilidade do problema no SUS e necessidade urgente por ações.
Recentemente o Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome (MDS), lançou como parte integrante do Programa Brasil sem Fome a atualização da “Estratégia Intersetorial de Prevenção da Obesidade”, a fim de atuar em promoção da saúde e de segurança alimentar e nutricional de forma intersetorial. O Plano Plurianual 2024-2027 prevê a revisão dessa estratégia pela CGSAU/DESAU/SESAN. Reconhecemos como louvável a iniciativa. Ao mesmo tempo, gostaríamos de apoiar o Ministério da Saúde para ações de cuidado da obesidade no SUS, em todos os pontos da atenção, com mais transparência, reforçando a integralidade do cuidado e o protagonismo da pasta em relação à Linha de Cuidado de Sobrepeso e Obesidade (LCSO). Com isso, vislumbramos melhores resultados, ao empoderar a APS como ordenadora do cuidado, em coordenação com a Atenção Especializada e Hospitalar, para cuidado integral da pessoa com obesidade.
Entendemos, ainda, fundamental que o Ministério da Saúde revisite suas diretivas nas PORTARIA Nº 424, DE 19 DE MARÇO DE 2013 e PORTARIA Nº 425, DE 19 DE MARÇO DE 2013 relativas à LCSO, e estabeleça um plano de ação claro para atendimento das recomendações da OMS. Com isso, medidas mais efetivas de cuidado da obesidade acontecerão de forma coordenada pelo Ministério da Saúde no Brasil. O Modelo de Atenção às Condições Crônicas (MACC) para gestão dos casos de obesidade na Rede de Atenção à Saúde (RAS) é um importante alicerce para essa organização, apoiando ações de regulação na saúde com otimização de custo e atendimento mais integral dos casos, com apoio da equipe multidisciplinar e ampliação das equipes e-MULTI dentro do Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas (PCDT) da obesidade. Isso permitirá a diminuição de filas na atenção especializada e hospitalar para cuidado da condição.
Recomendamos que o Ministério da Saúde mantenha as relações de comunicação e cooperação interfederativas com as secretarias estaduais e municipais de saúde, com as instâncias de controle e sociedade civil organizada, para que a agenda da obesidade tenha maior robustez, capilaridade e implementação efetiva e significativa. Ademais, neste momento de revisão de indicadores e financiamento da APS, será fundamental incluir indicadores de obesidade no desempenho das equipes e territórios.
Entendemos, também, que o manejo da obesidade demanda que opções farmacológicas estejam disponíveis no SUS. Opções como a Sibutramina, Orlistate, Liraglutida, entre outras, devem ser consideradas uma vez que o uso de medicações não apenas auxilia no manejo, mas também evita o surgimento de outras condições associadas à obesidade, tais como diabetes mellitus, hipertensão e morte cardiovascular, conforme demonstraram os estudos clínicos XENDOS, SCALE e SELECT.
A atenção à obesidade deve ter o mesmo nível de urgência que outras CCNTs, para as quais o acesso equitativo a cuidados apropriados centrados na pessoa e o apoio e recursos de todo o sistema é um elemento básico dos cuidados da saúde. Pensando ainda no modelo das demais CCNTs, estamos de acordo com a importância das medidas de promoção e prevenção, mas enfatizamos que o tratamento com cuidados contínuos, amplos e de qualidade para pessoas com diagnóstico de obesidade deve acontecer seguindo os princípios de Universalidade, Integralidade e Equidade do SUS.
Despedimo-nos agradecendo a cordial atenção de V.Exa. e nos colocamos à disposição para apoiar que o Ministério da Saúde tenha protagonismo na articulação de um plano nacional de cuidado da obesidade abarcando diversos pontos da Rede de Atenção à Saúde (RAS) no SUS, revisitando suas diretrizes segundo as recomendações da OMS, consolidando e apoiando estados e municípios na instituição de uma LCSO consistente e resolutiva. Para isso, insistimos na importância da constituição de uma Coordenação de Obesidade no Ministério da Saúde. Recomendamos ainda a parceria com outras áreas e setores, a fim de melhorar a conscientização e a compreensão das causas e do impacto da obesidade, para reduzir os preconceitos e o estigma do peso, incentivando o amplo uso do “Linguagem Importa” e priorizando sempre o cuidado humanizado e resolutivo para os cidadãos do Brasil.
21/06/2024
Respeitosamente,
Aline Marcadenti de Oliveira, PhD
Nutricionista pesquisadora
Instituto de Pesquisa do Hcor
Ana Carolina Micheletti Gomide Nogueira de Sá, MSc, PhD
Professora Adjunta
Departamento de Enfermagem Materno Infantil e Saúde Pública
Escola de Enfermagem da UFMG
Andrea Levy
Presidente
Instituto Obesidade Brasil
Balduino Tschiedel, MD
Diretor-Presidente
Instituto da Criança com Diabetes
Bruna Paola Murino Rafacho, MSc, PhD
Docente e pesquisadora
Faculdade de Ciências Farmacêuticas, Alimentos e Nutrição da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS)
Bruno Halpern, MD, PhD
Presidente, Associação Brasileira para Estudo da Obesidade e Síndrome Metabólica (ABESO)
Vice-Presidente, América Latina da World Obesity Federation (WOF)
Camila Medeiros da Silva Mazzeti, MSc, PhD
Coordenadora Geral
Observatório de Condições Crônicas e Alimentação (OCCA)
Claudia R. C. Moreno, MSc, PhD
Professora Titular
Depto de Saúde e Sociedade
Faculdade de Saúde Pública (FSP-USP)
Dhianah Santini de Oliveira Chachamovitz, MD, MsC, PhD
Diretora do Departamento de Educação & Campanhas, Sociedade Brasileira de Diabetes
Professora de Endocrinologia da YDUQS-IDOMED
Doralice Batista das Neves Ramos, MSc, PhD
Analista de saúde
Painel Brasileiro da Obesidade
Elton Junio Sady Prates, BSN
Secretário Geral
Associação Brasileira de Enfermagem Seção Minas Gerais (ABEn-MG)
Erlon Oliveira de Abreu Silva, MD, MSc
Cardiologista clínico e intervencionista; Pesquisador
Instituto de Pesquisa do Hcor
João Eduardo Salles, MD, PhD
Diretor do Departamento de Medicina e Professor Adjunto e Coordenador da Disciplina de Endocrinologia e Metabologia
Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo
José Vanilton de Almeida, MSc
Coordenador do Comitê de CCNTs
Conselho Regional de Farmácia do Estado de São Paulo (CRF-SP)
Juliana Nabarrete
Coordenadora de Assistência
SAS Brasil
Karla Melo, MD, PhD
Coordenadora de Saúde Pública, Epidemiologia, Economia da Saúde e Advocacy
Sociedade Brasileira de Diabetes (SBD)
Mark Barone, PhD
Fundador e Coordenador Geral
Fórum Intersetorial de CCNTs no Brasil (FórumCCNTs)
Maria Aparecida Turci, MRes, PhD
Docente do Curso de Medicina da Universidade Professor Edson Antônio Velano
Pesquisadora do Centro de Telessaúde do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG)
Maria Edna de Melo, MD, PhD
Coordenadora da Liga de Obesidade Infantil
Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HC-FMUSP)
Michely Arruda Bernardelli
Presidente
Associação Doce Vida
Patrícia Nelly Alves Meira Menezes, MSc
Programa Academia da Cidade / Academia da Saúde
Secretaria Executiva de Atenção à Saúde, Prefeitura do Recife
Patrícia Vieira de Luca, MSc
CEO
Associação Brasileira de Hipercolesterolemia Familiar (AHF)
Paulo Augusto Carvalho Miranda, MD, PhD
Presidente
Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM)
Priscila Juceli Romanoski, MSc, PhD
Referência Técnica Estadual de Condições Crônicas
Diretoria de Atenção Primária à Saúde do Estado de Santa Catarina (SES-SC)
Priscila Torres da Silva, MSc
Conselheira Nacional de Saúde no segmento dos Usuários (CNS)
Coordenadora de advocacy e responsabilidade social
Biored Brasil - Grupar-BR
Ronaldo José Pineda Wieselberg, MD, MPH
Presidente
ADJ Diabetes Brasil
Referências Bibliográficas
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Na imprensa
Jornal da USP
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